Exploramos as discussões que ocorrem nas esferas administrativa e judicial acerca da base de cálculo do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) no estado de São Paulo, especificamente no contexto da doação de quotas de sociedade empresária limitada.
A base de cálculo do ITCMD é o valor venal do bem transmitido, entendido como o valor de mercado na data do fato jurídico-tributário. Isso é estabelecido pelo artigo 9º da Lei nº 10.705/2000:
“Artigo 9 — A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em Ufesps (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).”
No entanto, o artigo 14, §3º, da mesma lei apresenta uma norma específica para a transmissão de quotas de sociedades que não são cotadas em bolsa de valores ou que não tenham sido negociadas nos últimos 180 dias, determinando que a base de cálculo seja o valor patrimonial das quotas transmitidas.
“Artigo 14, §3º — Nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação, ou não tiver sido negociado nos últimos 180 dias, admitir-se-á o respectivo valor patrimonial.”
Apesar desse dispositivo, podem surgir dúvidas sobre o conceito de “valor patrimonial”. Nesse contexto, Fábio Ulhoa Coelho ensina que existem dois tipos de valor patrimonial: o contábil, que resulta da divisão do patrimônio líquido da empresa pela quantidade de quotas existentes, e o real, que reflete o preço pelo qual as quotas seriam negociadas no mercado. Frequentemente, o valor patrimonial contábil difere do valor real, já que as demonstrações contábeis seguem critérios específicos de avaliação e não acompanham as variações no valor dos bens em tempo real.
Recentemente, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo emitiu a Resposta à Consulta Tributária 24429/2021, onde posicionou-se no sentido de que o valor patrimonial que mais se aproxima do valor de mercado das quotas deve ser utilizado como base de cálculo do ITCMD.
Sobre essa questão, com exceção de alguns acórdãos divergentes, o Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (TIT/SP) tende a seguir o entendimento das autoridades fazendárias paulistas.
É importante destacar, contudo, que em um recente julgamento, embora tenha concluído pela adoção do valor de mercado em detrimento do valor patrimonial, o juiz relator Rogério Hideaki Nomura expressou opinião pessoal contrária, declarando que:
“De fato, não havendo, no caso, transmissão de bens imóveis, mas sim, de cotas sociais que, via de regra, não possuem valor de mercado preestabelecido, deve-se adotar, para fins de apuração da base de cálculo do ITCMD, o valor patrimonial líquido (contábil) (…) Isto porque, ainda que se pudesse compreender, a princípio, que o ‘bem’ e o ‘direito’ previstos no caput do artigo 14 abrangeria as cotas sociais, é fato também que o §3º contempla expressamente as participações societárias que não foram ou não tiveram sido objeto de negociação nos últimos 180 dias. Daí, logicamente, a preferência da regra específica em detrimento da geral.”
De forma semelhante, Leandro Paulsen ensina que deve ser adotado o valor patrimonial contábil das quotas doadas, calculado pela divisão do valor do patrimônio líquido pelo número de ações, quotas ou participações que compõem o patrimônio da empresa.
Atualmente, a questão está pacificada no Judiciário, que tem manifestado entendimento favorável aos contribuintes, adotando o valor patrimonial contábil das quotas transmitidas como base de cálculo do imposto, conforme descrito no balanço da empresa. Esse entendimento é evidenciado nos recentes julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
Portanto, embora o posicionamento da esfera administrativa possa representar um risco de autuação visando à cobrança do ITCMD sobre o valor de mercado das quotas, o Poder Judiciário é firme em adotar o valor patrimonial contábil como base de cálculo do imposto no caso de doações.
Equipe Vignatax