Novo entendimento da Receita Federal não encontra respaldo legal
Em junho deste ano, foi publicada a Solução de Consulta (SC) COSIT 107, em que a Receita Federal alterou seu entendimento para concluir pela incidência de PIS/Cofins-Importação sobre remessas ao exterior relacionadas a contratos de licença de uso e atualização de software.
Tal modificação teve como fundamento a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, ao dirimir conflito de competência entre estados e municípios, reconheceu que as operações com software de mesa ou prateleira estariam sujeitas ao Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISS), uma vez que a lei complementar do ISS prevê que “Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação” são serviços tributáveis pelo imposto municipal (item 1.05, da Lei Complementar 116/03) (ADIs 1.945/MT e 5.659/MG). Por entender que tais remessas seriam contraprestações a serviços prestados, haveria importação de serviço sujeita ao PIS/Cofins-importação nos termos da Lei 10.865/2004.
Antes disso, o fisco federal entendia que não incidência de PIS/Cofins-Importação sobre remessas ao exterior relacionadas à aquisição de licenças de uso e atualização de softwares (disponibilização do download do software ou da atualização), por considerar que tais remessas teriam natureza de royalties e que não caracterizariam contraprestação por serviço prestado (SC 117/2019, 316/2017, 2021/2021).
Entendemos que essa nova posição da Receita Federal não encontra respaldo jurídico e nem legal. O precedente do STF não se estende ao PIS/Cofins-Importação, pois o racional depende da previsão expressa na legislação do ISS, sendo que não há tal expediente na legislação do PIS/Cofins-Importação.
Ora, o fato gerador dessas contribuições é a importação de bens ou serviços, não abrangendo licenciamento de intangíveis. O contrato de licenciamento de software não se refere a serviços, ainda que esteja na lista anexa à Lei Complementar 116/2023.
De acordo com a legislação federal, o uso de software deve ser objeto de licença; sendo que o regime de proteção à propriedade intelectual de software é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais. No mais, a legislação de direitos autorais arrola, expressamente, os softwares como obras intelectuais protegidas como direitos autorais.
Em razão desse cenário legislativo, a contraprestação para a obtenção da licença de uso do software tem a natureza de royalties, não devendo ser tributada pelo PIS/Cofins-importação.
De mesma forma, a legislação do Imposto de Renda dispõe, expressamente, que são classificados como “royalties” os rendimentos decorrentes da exploração de direitos autorais (art. 22, da Lei 4.506/1964). Neste ponto, a Solução de Consulta COSIT 107/2023 seria contraditória, por reconhecer a natureza de royalties para fins de IRRF, nos seguintes termos:
“Assunto: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte – IRRF
LICENÇA DE USO DE SOFTWARE. PAGAMENTO, CRÉDITO, ENTREGA, EMPREGO OU REMESSA PARA O EXTERIOR. USUÁRIO FINAL. AQUISIÇÃO OU RENOVAÇÃO. ROYALTIES. TRIBUTAÇÃO.
Os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos em a residente ou domiciliado no exterior, pelo usuário final, para fins de aquisição ou renovação de licença de uso de software, independentemente de customização ou do meio empregado na entrega, caracterizam royalties e estão sujeitos à incidência de Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF), em regra, sob a alíquota de 15% (quinze por cento)”.
Ocorre que o artigo 20, § 1º, da legislação do PIS/Cofins-Importação determina que, no que couber, tais tributos se sujeitam à legislação do imposto sobre a renda. Por esse motivo, a Receita Federal não poderia ter alterado seu entendimento apenas para fins de PIS e Cofins, mantendo a natureza de royalties para IRRF.
A nova Solução de Consulta traz insegurança aos contribuintes, pois, como é vinculante no âmbito da Receita Federal, aqueles que não recolherem o PIS/Cofins-Importação sobre as remessas ao exterior estão sujeitos a autuações fiscais, inclusive com multa de 75%, razão pela qual o Poder Judiciário se torna uma alternativa viável para a discussão jurídica do tema. Temos uma equipe especializada no tema.
Fonte: JOTA